O mito da meritocracia em tempos de desigualdade estrutural
Vivemos num discurso que nos vende uma promessa bonita:
que, se nos esforçarmos, se dermos tudo de nós,
vamos vencer.
Que o mérito é a chave que abre todas as portas.
Mas essa narrativa esconde um segredo incómodo:
nem todos começam a corrida na mesma linha.
A meritocracia é um mito cuidadosamente construído para ocultar o que é brutalmente real:
que o lugar onde nascemos, a cor da nossa pele, o género que nos atribuíram,
o dinheiro que temos — ou não — no bolso,
tudo isso determina em grande parte a trajetória que podemos ter.
Não é o esforço individual que garante o sucesso,
mas sim o conjunto desigual de oportunidades — ou a falta delas — que nos é dado.
Quando uma criança cresce numa casa sem acesso a livros, a bons professores,
quando uma mulher tem de lutar contra preconceitos no trabalho,
quando comunidades inteiras são marginalizadas,
a ideia de que “todos podem chegar lá” torna-se uma mentira cruel.
Essa promessa de mérito absoluto responsabiliza o indivíduo pela sua própria pobreza,
ignora as estruturas que criam e perpetuam a desigualdade,
e nos faz acreditar que os “fracassos” são sempre falhas pessoais.
Enquanto isso, o sistema mantém-se intocado,
protege privilégios, e celebra o “sucesso” de alguns como prova de justiça.
Desconstruir o mito da meritocracia é, por isso, um ato político e urgente.
É reconhecer que justiça social não é sobre premiar os que “merecem” — é sobre desmontar barreiras, redistribuir oportunidades,
e construir um mundo onde o esforço seja realmente valorizado.
Porque sem isso, continuaremos a correr numa pista desigual, onde poucos chegam à linha de chegada,e muitos ficam para trás, invisíveis.
PB
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