Agora que a escola vai começar… não encha.

Setembro chega e, com ele, a inquietação dos pais: “Já tens futebol, natação, mandarim e violino, mas se calhar ainda cabem as aulas de robótica e expressão dramática às quartas e as explicações às quintas. O importante é estar ocupado!”.

Como se a infância fosse um horário de gestão de topo.

O problema é esse: confundimos “aproveitar o tempo” com não parar nunca. E achamos bonito quando a criança “tem mil coisas”, como se isso fosse sinónimo de inteligência, futuro brilhante e produtividade precoce.

Mas ninguém, repito, ninguém, tem que estar sempre ocupado. Muito menos uma criança.

As crianças precisam de tempo. Para brincar sem objetivos. Para não fazer nada. Para imaginar. Para se aborrecer (sim, aborrecer!). Porque é nesse tédio criativo que nascem os mundos internos — aqueles que a escola, os treinos e os cursos de programação não têm como ensinar.

Excesso de ocupação não forma crianças mais fortes. Forma crianças mais ansiosas. Mais cansadas. E, muitas vezes, mais tristes — embora não digam. Porque até nisso se habituaram: a não parar nem para sentir.

Claro que há atividades maravilhosas. O desporto, a música, a arte, a ciência. Tudo isso pode ser riquíssimo — desde que venha com equilíbrio e não como uma agenda corporativa em ponto pequeno. As crianças não são um currículo ambulante. Não estão a ser “preparadas para o mercado”. Estão a viver. E viver não se resume a fazer.

Aliás, há um tipo de infância que não volta: aquela em que o tempo parecia não ter dono, em que o chão era mundo, e os finais de tarde vinham com cheiro a terra, não com pressa para a próxima atividade.

Então, agora que a escola vai começar, pense bem antes de comprar uma agenda para o seu filho cheia de horários coloridos.

Dê-lhe tempo. Dê-lhe tédio. Dê-lhe pausas.
Porque só assim ela ou ele poderá crescer inteiro — e, um dia, até agradecer por ter tido espaço para ser criança… e não só aluno, atleta, músico ou futuro génio da tecnologia.



PB                                            🌼

Comments

Post a Comment

Popular posts from this blog

Querida C.

Quando uma mãe perde um filho é como se um pedaço do mundo tivesse sido apagado e o nome dele ecoasse num vazio que nunca volta. A morte de um filho deixa uma ausência tão intensa que não há palavras, apenas um silêncio que pulsa dentro de cada respiração do coração desta mãe. Mas perder um filho não pode ser só sobre ausência ou dor: tem que ser também, e essencialmente, sobre fé. E esperança. A esperança de que a vida não termina no fim do corpo, de que há um reencontro numa outra curva da eternidade, onde o tempo não tem pressa e o amor nunca se perde. Quem parte não desaparece. Volta no sonho leve, no perfume de uma tarde, no canto de um pássaro inesperado, na brisa que sussurra um nome que só o coração entende. Talvez o céu se abra um pouco, todos os dias, para que os olhos da alma possam ver o que os olhos do corpo não alcançam. E ali, na intersecção entre o agora e o sempre, o amor segue vivo, em forma de luz e de paz. Sabes C., o tempo não vai apagar a tua do...
Read more

uma espécie de mantra

Acredito que ninguém entra na nossa vida por acaso. Acredito que todas as pessoas têm alguma coisa para nos ensinar, para nos ajudar a crescer e a evoluir. Talvez, por isso mesmo, eu valorize tanto as pessoas que vão entrando na minha vida! Cada aluno que chega traz consigo uma mãe e uma família que vou acrescentando à minha própria. Cada aluno traz consigo uma bagagem, uma história e um caminho para percorrer. A partir do momento que entra na minha vida, passamos a percorrê-lo juntos, influenciando-nos mutuamente, crescendo em sintonia e acrescentando valor em simultâneo. Aprendo muito com as minhas pessoas pequeninas (sendo que, pequeninas, são todas as minhas pessoas que vão dos 11 aos 18) ... com elas aprendo a relativizar, a rir no meio da desgraça e a ver organização mesmo quando o caos está instalado!! São também deles os melhores sorrisos, os maiores abraços e as mais sentidas verdades! Mesmo as que não queríamos ouvir - ("professora, que aconteceu ao teu cabelo hoje?? Est...
Read more

Boas notas, más notas (ou como tirar 80% e ainda levar sermão)

Dizem que as boas notas são o aplauso da escola. Que são medalhas em forma de números. Que são passaporte para um futuro brilhante e um presente orgulhoso. Mas e se, às vezes, as boas notas forem só... disfarces? É que muitas vezes é possível maltratar com boas notas. Acham que não? Há crianças que tiram 19 e acham que falharam. Que tremem nas vésperas dos testes como quem entra numa arena, não numa sala de aula. Que tiram 80%, com esforço, lágrimas e talvez um pacto com todos os santos — e, em vez de “Parabéns!”, ouvem um gelado: “E os outros 20% foram para onde?” É o clássico dos pais sempre insatisfeitos. Que confundem exigência com perfeição. Que acham que amar é empurrar para cima, sem perceber quando o filho já está sem chão. Pais que olham para um 80% e perguntam se o colega do lado tirou mais. Que respondem “Sim, mas…” a todas as vitórias. Que vivem como se os boletins escolares fossem espelhos da sua própria autoestima parental. Mas a verdade é que educar não é exigir semp...
Read more