Ausência
Setembro é sempre um mês meio acre meio doce para mim. Se por um lado se dá o regresso às aulas (e toda a gente sabe o quanto gosto de ensinar e estar com os meus alunos), por outro lado, o meu pai nasceu e faleceu em setembro. Por isso, este mês é sempre um misto de alegria e tristeza, de esperança e nostalgia.
Quando perdi o meu pai, há 30 anos atrás, vivi um dos piores momentos da minha vida. Aliás, não foi um dos piores, foi o pior! Perder o meu pai foi perder o meu melhor amigo, o meu confidente, o meu porto seguro e uma parte de mim, tudo concentrado na mesma pessoa! Por isso, nessa altura entrei num período de grande tristeza e de grande amargura. Deixei de comer, chorava muito e estava incapaz de sentir alegria e prazer em viver. Aos poucos, instalou-se a apatia e o desinteresse por tudo ou quase tudo, e, sem vontade de estar em lugar nenhum, afastava-me das pessoas e não me apetecia nada: nem ler, nem ver TV, nem ouvir música. No fundo, uma incapacidade de ser e estar comigo própria, uma incapacidade para estar desperta e de me sentir viva.
Os médicos amigos ensaiavam discursos e medicamentos para me dar, alguma coisa que me ajudasse a voltar a mim e à vida. Foram vários ensaios e tentativas e todas ficaram pelo caminho, com caixas deixadas a meio.
Foi um tempo difícil de viver. Um tempo onde, apesar de tudo, nunca deixei de trabalhar nem de estudar. Trabalhava pela necessidade de me ocupar e cansar, e estudava pela obrigação de não acrescentar mais desânimo nem frustração, à longa lista de problemas.
Foi um longo ano. Um ano inteirinho de dor, tristeza e cuidado. O cuidado que continuei a ter com o meu avô Miguel (que morava comigo) e que precisava de mim e o cuidado que tinha com a minha mãe, de quem tomei sempre conta e a quem nunca deixei faltar nada, além de quem nos faltava às duas.
Costumo dizer que neste ano atravessei o deserto, tal foi a aridez do que vivi.
Mas, nunca há "nem bem que sempre dure nem mal que não se acabe", e um dia, sem esperar, apaixonei-me. Resisti internamente, travei guerras civis comigo mesma, mas quem estava decidido a ficar comigo não se afastou e o amor venceu! Venceu porque me resgataram de um lugar escuro, me apanharam no meio do caos e me trouxeram de novo à vida! A dor ficou mais suportável, o equilíbrio foi-se estabelecendo e a vontade de estudar também. Não foi fácil ainda assim, houve recaídas, quedas e lágrimas, mas não desistiram de mim e, sempre que perdia o pé, puxavam-me para a superfície.
29 anos anos depois posso dizer que continuo irresistível e profundamente apaixonada, e que esse amor continua a não desistir de mim e a resgatar-me de todas as vezes que, em setembro ou no Natal, se faz noite escura no meu coração.
Esta é parte da minha história e do amor que a salvou. Um amor que ainda hoje me aconchega e embala quando os pesadelos à noite me atormentam, que foi sempre firme, forte e constante, um amor que continua a resgatar-me todos os dias e a empurrar-me para a frente quando me deixo para trás.
E porque a vida, às vezes tira, mas às vezes também sabe dar, setembro tornou-se ainda um mês melhor quando, há 20 anos a vida me deu um amor grande e imenso: a minha azulinha que faz anos em setembro! A vida, nas suas imensas voltas e (re)voltas, a vida nos seus pequenos (grandes) milagres a mostrar que vale a pena andar cá e como dizia o poeta "Feliz [de] quem não exige da vida mais do que ela espontaneamente lhe dá"!
Se vos disserem que o amor salva, não duvidem. Salva mesmo. A mim, foi o que me salvou...
PB
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